TENDÊNCIA DE MODA
A moda Gótica e Lolita chega aos EUA
por Paulo Fernando – publicitário e consultor de mercado e marketing de varejo
Na maioria das vezes, as discussões no Web log um fórum de por volta de 2,5 mil partidários da moda gótica e lolita que Lam administra de sua casa em Dallas, revolvem sobre questões como onde comprar sapatos plataformas enormes ou como criar colarinhos Bo Peep. Mas durante o inverno, as trocas normalmente educadas deram espaço a declamações raivosas, freqüentemente profanas.
Em questão estava a fantasia de Alice no País das Maravilhas de Gwen Stefani no vídeo “What You Waiting For”. Alice, com seu limpo colarinho branco, suas mangas femininas e saias em forma de sino, é uma musa informal para muitas GLs, como as góticas e lolitas se chamam, e o sentimento de que Stefani abastardou o visual ao expor calcinhas azuis onduladas e salto-altos de lacinho, tornando o visual mais de dominatrix do que discreto.
Essa roupa não tem nada a ver com lolita, lia-se em uma das mensagens postadas mais contidas. Não é nem original, parece o que Britney vestiu quando beijou Madonna.
Apesar de anáguas e sombrinhas dificilmente serem roupas de shopping centers, Lam disse que o vídeo era um sinal de que a estética gótica e lolita, uma vez adorado por poucos, pode estar entrando no mainstream, onde pode ser apropriado e corrompido por muitos. Apenas nos últimos seis meses, disse Lam, blogs foram invadidos por homens procurando fotos de garotas em sensuais roupas góticas e lolitas. Isso nunca acontecia até recentemente, disse Lam. Está entrando cada vez mais em foco, e vai ficar cada vez mais e mais popular.
Não que Stefani seja a primeira celebridade a chamar atenção para a moda gótica e lolita; Amy Lee, a cantora do Evanescence, veste vestidos negros rendados apreciados por alguns GLs, e ano passado Courtney Love foi co-autora de uma revista em quadrinhos de estilo japonês sobre a Princesa Ai, personagem baseado livremente em Love que usa vestidos em estilo gótica e lolita. Nem Lee ou Love, no entanto, atraiu a atenção que Stefani conseguiu. Ela incorporou o estilo no seu show, viajando com uma trupe chamada garotas Harajuku, nome baseado em um bairro famoso em Tóquio onde muitas garotas do estilo se reúnem nos fim de semana.
O gótica e lolita iniciou-se no meio dos anos 90 entre as estudantes japonesas inspiradas pela banda Malice Mizer e em particular por Mana, o guitarrista efeminado da banda, que usava vestidos rendados brancos e pretos, laços elaborados, cílios falsos e maquiagem pesada.
O visual pegou como parte da cultura cosplay japonesa, onde os jovens se fantasiam como figuras icônicas do pop, muitos deles sendo personagens de desenhos animados. Logo as adolescentes estavam costurando recriações das fantasias de Mana manualmente. Estilistas locais logo seguiram, e no fim das contas, Mana lançou sua própria linha, Moi-meme-Moitie, vendida em lojas de departamento japonesas.
Em 2000, os editores da revista de moda japonesa Kera publicaram a Bíblia Gótica & Lolita, que cresceu em uma circulação de 80 mil exemplares. Parte catálogo, parte revista de moda, ela tem modelos para fabricação de fantasias assim como receitas para bolinhos de chocolate com cruzes de açúcar que góticas e lolitas (ou Goth-Lolis, como são conhecidas no Japão) servem em festas de chá.
Enquanto o visual se espalhava, ele inspirou diferentes interpretações, então, além do tradicional visual gótica e lolita, que se baseia no gótico com vestidos brancos e pretos, grandes sapatos pretos, maquiagem pesada, existe também a Doce Lolita, explodindo com ondulações e pastéis; a Elegante Gótica Lolita, estilo vitoriano com corsete; e Estudante Lolita, favorecendo saias com dobras e meias até os joelhos.
Além de gastar centenas, se não milhares de dólares na moda gótica e lolita, os seguidores americanos da tendência entram em comunidades on-line, invadem livrarias japonesas e o eBay em busca da Bíblia Gótica & Lolita (pode-se encontrá-la por US$20 em livrarias e por até mais de US$50 on-line), e se encontram para festas de chá onde se fantasiam e comem bolos. Muitos, ela disse, também vão a convenções de animes, onde as pessoas celebram todas as coisas japonesas.
Michelle Nguyen, 22, viveu no Japão por cinco meses em 2003 e se tornou uma leitora regular da Biblia Gótica & Lolita. Agora no último ano de inglês, propaganda e japonês na Universidade Penn State, ela compra saias japonesas e vestidos no eBay e começou a aprender a costurar para fazer suas próprias fantasias. Ela possui quatro sombrinhas, várias saias pastéis e muitos laços. Ela e amigas organizam saídas góticas e lolitas, onde se vestem e tomam chá ou vão a filmes como Desventuras em Série, cujo figurino evoca o estilo gótico e lolita.
Ela disse que às vezes recebe olhares de estudantes no campus. Eu costumava usar grande saias com rufos nas aulas, mas é difícil, ela disse. Você tem que sentar na carteira, e com uma saia com rufos, não dá para fazer isso.
Lam, que faz faculdade e trabalha em uma companhia de petróleo e gás em Dallas, tem mais de 10 trajes completos de gótica e lolita, em que gastou milhares de dólares. Ela disse que nem pensaria em vestir um para trabalhar. Metade teria um ataque cardíaco, e não sei sobre a outra metade, ela disse de seus companheiros de trabalho. Minha mãe, quando me viu pela primeira vez fantasiada, disse, porque apenas não guardamos as suas roupas de bebê?
Quanto ao seu namorado, ela disse: Ele realmente gosta de me ver em coisas doces, toda de branco. Para mim é tipo, não posso usar algo mais prático?
Lam prevê que o tumulto sobre Stefani irá diminuir, apesar de ter mudado a natureza das conversas dos fãs de gótica e lolita para sempre. Um sinal promissor, ela disse, é que alguns fãs estão empolgados com a idéia de que a tendência não é mais somente deles.
Nós deveríamos estar lisonjeados que o estilo está chegando ao mainstream, lia-se em uma mensagem on-line. A moda é um direito livre.
Além disso, Lam apontou, quanto mais mainstream o visual se tornar, mais disponíveis as roupas se tornarão, e com um preço mais acessível também.
The New York Times – Laura M. Holson
Glossário
Cosplay abreviação de “costume player” (Fantasia em inglês) é uma atividade que surgiu nos Estados Unidos da América em convenções de quadrinhos na decada de 70, quando fizeram uma promoção onde as pessoas com fantasias de Super-herois entrariam de graça. Com o passar do tempo foi se tornando uma tradição e um habito que se espalhou por todos os tipos de convenções envolvendo series ou personagens, principalmente as de “Jornada nas estrelas”Star Trek e “Guerra nas estrelas”Star Wars, aonde as pessoas fantasiadas se tornaram a principal atração com concursos de fantasia e interpretação de cenas dos filmes ou episodios revelando talentos de nivel profissional. Rapidamente se espalhou pelo mundo todo, chegando na Comiket, famosa convenção realizada há anos no Japão aonde o termo se popularizou e se espalhou especialmente em eventos e encontros de anime, mangá e videogames, respectivamente as animações e quadrinhos japoneses.
Mangá Os mangás têm suas raízes no período Nara (século VIII d.C.) com a aparição dos primeiros rolos de pintura japoneses: os emakimono. Eles associavam pinturas e textos que juntos contavam uma história à medida que eram desenrolados. O primeiro desses emakimono, o Ingá Kyô, é a cópia de uma obra chinesa e separa nitidamente o texto da pintura.
A partir da metade do século XII, surgem os primeiros emakimono com estilo japonês, do qual o Genji monogatari emaki é o representante mais antigo conservado, sendo o mais famoso o Chojugiga, atribuído ao bonzo Kakuyu Toba. O Chojugiga está guardado no templo de Kozangi em Quioto. Nesses últimos surgem, diversas vezes, textos explicativos após longas cenas de pintura. Essa prevalência da imagem assegurando sozinha a narração é hoje uma das características mais importantes dos mangás.
No período Edo, em que os rolos são substituídos por livros, as estampas eram inicialmente destinadas à ilustração de romances e poesias, mas rapidamente surgem livros para ver em oposição aos livros para ler, antes do nascimento da estampa independente com uma única ilustração: o ukiyo-e no século XVI. É, aliás, Katsushika Hokusai o precursor da estampa de paisagens, nomeando suas célebres caricaturas publicadas de 1814 à 1834 em Nagoya, cria a palavra mangá significando “desenhos irresponsáveis” que pode ser escrita, em japonês, das seguintes formas: Kanji (漫画, Kanji?), Hiragana (まんが, Hiragana?), Katakana (マンガ, Katakana?) e Romaji (Manga).
Gothic Lolita ou “GothLoli” (ゴスロリ, gosurori) é uma moda urbana japonesa popular entre adolescentes e jovens adultas (e por vezes pessoas do sexo masculino), que vestem roupas de inspiradas, em sua maioria, pela moda vitoriana, rococó ou edwardiana e freqüentemente tentam imitar a aparência de bonecas de porcelana ou princesas. A origem do gosurori é uma combinação da moda lolita que envolve tentar parecer fofa ou meiga a ponto de parecer infantil e certas características da moda gótica.
A cultura japonesa dá muito mais importância a uma aparência e comportamento juvenis do que a ocidental, e algumas mulheres adultas compram coisas como produtos com a estampa da Hello Kitty que no ocidente geralmente tem crianças como público-alvo. O Gosurori talvez seja uma extensão desse fenômeno, conhecido como Cute Culture.
O estilo floresceu nos idos de 1997/1998 e se tornou um estilo bem estabelecido, com suas próprias grifes, disponível em diversas boutiques, e até mesmo em algumas grandes lojas de departamentos a partir de 2001. Alguns consideram o gosurori como uma resposta ao movimento Kogal, tido pelas lolitas como vulgar, já que envolve exposição do corpo e sensualidade. No entanto, o gothic lolita talvez não possa ser considerado como uma subcultura propriamente dita já que não existe uma ideologia ou um credo comum a todas, um padrão de comportamento, nem música ou arte específicas a serem apreciadas – mas acima de tudo lolitas não são criaturas necessariamente grupais, que buscam socializar com outras lolitas. Sendo assim individualistas, não há como classificá-las como uma tribo.
Gothic Lolita é uma das subcategorias do visual Lolita (Loli). Outras categorias incluem Classic Lolita (mais tradicional, contando com estampas florais, cores mais claras e mais sofisticadas, e com ar mais maduro), Sweet Lolita (tons pastéis, temas angelicais, renda, laços e flores), Ero Lolita (que usa cinta-ligas, saias mais curtas, corsets e babydolls), Punk Lolita (usa de corsets, tecidos em xadrez, estampas com caveiras), Country Lolita (abusando de estampas quadriculadas e florais para criar o efeito meigo e campestre) e Gurorori (com temas mais mórbidos e obscuros, incluindo muitas vezes tapa-olho, bandagens e sangue falso).
O estilo foi influenciado e tornado ainda mais popular pela imagem de certas bandas de Visual Kei (ou rock visual, lit. linhagem visual), que possuem ou possuíam entre seus integrantes usuários ou fãs do visual lolita. O Visual Kei é um subgênero do rock japonês formado por bandas de visual elaborado, cujas apresentações muitas vezes contam com elementos teatrais mas com estilo musical que muitas vezes difere de outros grupos enquadrados na mesma categoria. É importante ressaltar que várias lolitas ressentem essa ligação com visual kei e consideram lolitas fãs dessas bandas e ídolos como bandgirls e não lolitas “de verdade”: como se as lolitas fãs de visual rock se vestissem de lolita apenas por influência de seus ídolos, para se encaixar com os outros fãs e não por gostarem do estilo.
Mana, o líder da extinta banda de visual kei Malice Mizer, é creditado como tendo ajudado a popularizar o Gothic Lolita. Ele criou os termos Elegant Gothic Lolita (EGL) e Elegant Gothic Aristocrat (EGA) para descrever as peças de sua própria grife Moi-même-Moitié, fundada em 1999 que rapidamente se estabeleceu como uma das marcas mais desejadas da cena Gothic Lolita. No ocidente, o termo “EGL” diversas vezes é tratado como se abrangesse toda a moda Lolita, ou como se fosse um sinônimo de “Gothic Lolita”. “EGL” na verdade refere-se somente à linha de roupas da grife Moi-même-Moitié que leva este nome – e que é formada por roupas Gothic Lolita.