Sophie van der Stap, a garota das nove perucas
No Dia Mundial da Luta contra o Câncer, confira a história da holandesa que perdeu os cabelos com a quimioterapia, mas ganhou nove vidas diferentes.
Em 26 de janeiro de 2005, Sophie van der Stap buscava respostas para as constantes pontadas que sentia no pulmão, o emagrecimento repentino e seu rosto sempre tão pálido. Ela tinha acabado de conquistar uma vaga no curso de Ciências Políticas da Universidade de Amsterdã, na Holanda, e sua vida estava tão boa. Tinha 21 anos, um milhão de amigos, uma carreira bacana se anunciando…
“Entrei então na sala do Doutor K. E o sorriso que eu trazia no rosto logo se fechou. Recebi a notícia mais dolorida de toda a minha vida: tinha um câncer raro que começou no fígado e se espalhou para a membrana dos pulmões, chamada de pleura. Muitas coisas passavam pela minha cabeça enquanto eu ouvia do médico as palavras agressivo, metástase, raro. Não tenho lembranças muito claras desses minutos, estava meio em transe. Recuperei a consciência quando, ao fim da consulta, o médico disparou: Você tem apenas 54 semanas de vida. Sinto muito.
Mal recebi o diagnóstico e já tive que enfrentar minha primeira sessão de quiioterapia. Quando dei por mim, estava no salão aparando os poucos tufos que me restavam. Saí de lá derrotada. O simples ato de se olhar no espelho é um lembrete macabro de que seu tempo está acabando. Tive a ideia de entrar na loja de perucas que ficava dentro do hospital. Escolhi algumas, provei… Argh! Elas me deixaram horrenda, com a aparência falsa. E o pior: coçavam demais. Odiei.
Stella,Sue, Daisy, Blondie, Platina, Uma, Pam, Lydia e Bebé
Passados alguns dias, fui com minha irmã numa loja de perucas para teatro. De frente para o espelho, experimentei vários modelos, até que… não é que uma peruca loira com cachos compridos me agradou e muito? Assim nasceu a Daisy. Soube, na hora, que ela tinha vindo pra ficar. Me olhei de todos os ângulos. Me senti uma garota desaforada e atrevida. Fiquei animada. De repente bati o olho num modelo com tufos ruivos, meio arrepiados, que mais tarde batizei de Sue. Como sou geminiana e tenho bastante dificuldade de fazer escolhas, saí da loja com as duas perucas… e duas novas personagens. Com o tempo, passei a achar mais graça na loja de perucas do que na H&M. Vi nascer então a Stella, mais careta e tímida, com cabelo castanho-claro bem curtinho, e a Blondie, de madeixas chanel loiras. Então, fui percebendo que todas elas juntas formavam uma nova Sophie. Multifacetada, forte, corajosa. Tipo como se cada peruca fosse um novo sopro de vida, de esperança, de amor próprio. Stella, Sue, Daisy, Blondie, Platina, Uma, Pam, Lydia e Bebé me salvaram.
Algo ruim em algo bom
Quando fiz 25 anos, já curada, deixei Amsterdã para recomeçar em Paris, cidade que sempre amei. Foi lá que decidi levar a sério meu dom para escrever. Durante todo o tempo que estive no hospital, fiz uma espécie de diário que se transformou no livro A Garota das Nove Perucas, lançado em 2006 lá fora e no ano passado no Brasil. Hoje, acabo de completar 30 anos. Um número incrível para quem achou que não passaria dos 21, não é mesmo? Faço exames de rotina periodicamente e morro de medo de encontrar um novo tumor. Mas sinceramente? Não fico pensando em como será o amanhã, a vida é hoje. Com o fim do tratamento, meus cabelos voltaram a crescer. Fracos e diferentes, mas fico feliz em saber que são meus. E quanto às perucas? Bem não posso dizer que elas pertencem ao passado. Ainda as uso ocasionalmente, durante o inverno como chapéu ou em festas, quando quero me perder na pista de dança. Hoje elas são apenas um acessório, mas um dia foram a salvação da minha vida”.
* Sophie veio ao Brasil a convite da marca de acessórios Fiszpan, durante as comemorações de 80 anos da empresa.